"Sou carioca, vivo na praia, não vou postar foto de biquini? Não tem como!" É assim que a modelo e maquiadora Livia Moreira responde quando é questionada sobre seu conteúdo no Instagram: é que ela é bem sereia mesmo, vive na areia da praia, e adora colocar o corpo pra jogo, como grandes gostosas gostam de falar - e fazer. Seu feed é elétrico: cores gritantes, cabelo vermelho, maquiagens absurdas e a temperatura sempre altíssima.
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Um Instagram que virou um espelho
"Eu sempre fui gorda, desde criança, mas quando você é adolescente sofre muito bullying e preconceito. Eu tinha muita vergonha de mim, do meu corpo, não me aceitava mesmo, e fazia de tudo pra tentar mudar", ela conta. Mas quando completou 18 anos e terminou os anos escolares, Livia se viu livre desse ambiente tão tóxico e resolveu mergulhar de vez em sua própria jornada: "Comecei a pesquisar no Instagram outras meninas mais parecidas comigo, com um corpo mais parecido com o meu, meninas com quem eu me identificasse. Eu comecei a me ver naquelas mulheres e me achar tão bonita quanto as achava", segue. "Foi assim que começou esse processo de me aceitar, de gostar mais de mim. Através de outras pessoas como eu. Rolou essa identificação e o fim da necessidade de tentar me encaixar ou me ver num corpo totalmente diferente do meu. Foi libertador". Os ecos dessa revolução pessoal foram sentidos, claro, na areia da praia: "Comecei a ir pra praia de biquini, não me importava mais com comentários de ninguém, com julgamentos, com mais nada".
Ser uma grande gostosa tem a ver com comunidade também
O que Livia colheu no Instagram, ela mesma planta hoje: usando a rede social para expandir ainda mais essa conversa, a maquiadora e modelo conta que adora ouvir de suas seguidoras como ela as ajudou a se aceitarem também. "Ajudei outras meninas mais novas da mesma forma que precisava dessa ajuda quando era adolescente, quando precisava me ver em alguém. É muito legal hoje em dia estar nesse lugar, de conversar com meninas mais novas e ver que elas me usam como referência para se aceitarem, para se amarem, para se sentirem melhor com o corpo delas".
"Eu existo assim, e sou linda assim, como qualquer outra pessoa, de qualquer outra cor ou corpo. É importante demais se sentir vista".
Livia Moreira
O papo ganha um tom de comunidade por quem já se viu oprimida por padrões e construiu os seus próprios, entendendo a força de ter uma rede da qual você se sinta parte. Uma rede cada vez maior e mais inspiradora. "Eu sou da geração da internet, mas esse boom das pessoas falarem sobre racismo e gordofobia veio agora, nessa onda junto comigo. Quando eu era adolescente o Instagram ainda não era tão forte, e na televisão eu não via tantas mulheres como eu. Isso me pressionava muito. Então quando rolou esse boom da internet, das pessoas mostrarem seu corpo e dizerem 'Meu corpo é lindo e merece ser visto do jeito que ele é', isso me ajudou a me enxergar também".
Hoje, Livia acredita que o mercado já mudou muito ("Você vê mais mulheres negras e pessoas gordas numa novela, num comercial, numa campanha"), e faz questão de falar sobre o quanto isso é importante: "É um sentimento de existência. Ver corpos como os seus na mídia é ver que a sua existência está ali, não está sendo apagada ou excluída. Ela está sendo documentada".
Mas todo dia é dia de close e autoestima lá em cima? Nem sempre: "Eu amo meu corpo e estou super de boa com ele, mas é claro que tem altos e baixos. Nem todos os dias a gente está satisfeita, mas hoje em dia tenho a cabeça mais tranquila, entendo que tudo bem eu não estar me sentindo legal um dia, mas no geral eu estou super satisfeita e amo meu corpo". Nos dias em que Livia precisa de um impulso, ela conta, de novo, com sua rede de apoio: "Nesses dias, recebo mensagens positivas, e me faz muito bem. Ser lembrada que você é linda quando você não está se sentindo tão interessante assim, sabe? A pressão de você ter que se sentir bem o tempo todo existe, mas ter minhas amigas do meu lado sendo essa voz, do 'Olha como você é linda, como seu corpo é parecido com o meu, você não me acha linda?', essa voz de fora pra dentro também ajuda. Dá um alívio saber que você tem uma voz que me ajuda, ali do seu lado, com você".
"A praia é onde me sinto mais livre. Por ter trabalhado tanto para conquistar essa liberdade de poder estar na praia de biquini, me sentir confortável, é lá onde eu mais amo estar".
Livia Moreira
Objetificação x liberdade
A discussão em torno da exposição do corpo feminino inevitavelmente esbarra no perigo da objetificação, mas Livia esclarece que seu feed apimentado nada tem a ver com isso: "Tem que ter cuidado com isso sim, mas pra mim é o lugar de ser livre", ela fala, sobre o conteúdo que produz. "Se uma menina magra posta uma foto de biquini, isso é visto como normal. Mas quando uma mulher gorda ou maior que eu posta, imediatamente a gente escuta 'Meu deus, como você é corajosa, que incrível, queria ter essa coragem', mas não tem nada a ver com isso. É sobre normalizar, é só um corpo de biquini. Eu posto muito mas desse lugar, de ser normalizado, de corpos como o meu serem vistos corpos normais, como qualquer outro".
"Eu me curto! Não é sobre coragem, não tem nada a ver com isso. Eu não quero provar nada, eu só quero ser normal. Sou carioca, vivo na praia, não vou postar foto de biquini? Não tem como!"
Livia Moreira
Renovando as definições de coragem, Livia termina: "Coragem para mim é eu ser quem eu sou. É todo dia levantar da cama e lutar por aquilo que eu sou - por conta da minha cor, por conta de ser mulher, do meu corpo. Coragem é botar a cara sem medo. Se quebrar la na frente, paciência, vambora".
Bora, Livia!