Assim como a gente aqui na Sallve, a Nathalia Fuzaro adora uma boa conversa e trocar experiências em que muitos aprendizados são compartilhados. Talvez por isso a essência do Inspira e Transpira (seu projeto em parceria com a também jornalista Natália Leão) seja justamente uma grande roda de conversa em que mulheres possam compartilhar, se informar e inspirar em uma visão livre, leve e construtiva sobre atividades físicas.
Mas para chegar até o trabalho que ela realiza hoje, a história da Nath se entrelaçou com o esporte desde a infância, passou por um período de afastamento, pela doença estenose de JUP e foi grande protagonista na mudança de vida e carreira que ela escolheu para si. O processo de liberdade e empoderamento que ela teve é o assunto de hoje aqui no blog, além de um papo sobre triathlon, o que é um corpo de atleta e a liberdade de se movimentar.
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O começo de tudo
“Sempre estive ligada com o esporte. A real é que eu sou sagitariana, então, naturalmente tenho um apreço por gastar energia. E a minha família sempre foi ligada ao esporte. Meu pai é atleta de tiro ao prato e tiro esportivo. Meu irmão é atleta olímpico, competiu em Londres 2012”, começa o papo a jornalista, que já trabalhou em redações de grandes revistas, como Vogue e Glamour Brasil.
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Desde que era pequena, a Nath participava de todos os times, de várias modalidades distintas, ainda na escola e no contraturno. Futebol, basquete, handebol, natação, queimada – tudo mesmo! “A gente passava a tarde inteira na escola, porque minha mãe ficava correndo atrás do tratamento da minha irmãzinha (que tinha câncer), então, estávamos seguros lá. Com isso, eu participava de todos os times, passava a tarde jogando todos os esportes. Sempre gostei disso”, relembra.
Aos 17 anos, ao mudar para São Paulo para fazer faculdade - ela é de Rio Claro, interior do estado -, acabou encontrando o combo "trabalho + estudo" e se afastou do esporte. Até dava um jeito de caminhar e praticar uma atividade física ou outra, mas não do jeito que fazia antes ou que faz atualmente. Foram dois ou três anos assim.
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Quando iniciou seu trabalho na Vogue Brasil, a Nath começou a sentir dores nas costas, um desconforto comum de quem fica muitas horas sentado e também de quem está sedentário. Por sugestão de uma das editoras da revista na época, acabou se reencontrando com o movimento: se matriculou em uma academia e começou a fazer aulas de corrida na esteira. “Retomei o gosto. Comecei a correr, a participar de provas de rua. Fui me animando”, conta.
Estenose de JUP e o caminho para o triathlon
No meio desse caminho, a jornalista deixou a Vogue Brasil e descobriu que tinha uma doença chamada estenose de JUP, que é uma má formação no canal do ureter, que liga o rim à bexiga. “Tive uma crise existencial, achei que eu ia morrer. Fiquei bastante doente e bastante fraca, cheguei a pesar 47 kg”, explica, dizendo também que junto com as dores que sentia, a tristeza se instalou.
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Com o diagnóstico, Nath precisou fazer uma cirurgia para retirar um rim, e foi aí que seu caminho voltou a se encontrar com o esporte de forma definitiva. “Lembro que eu estava na sala de espera do anestesista para fazer a operação, há seis anos, e li uma matéria em uma revista em que uma menina contava como ela venceu a depressão com o triathlon.”
“Quando eu li aquela matéria pensei: tá aí, o esporte é uma coisa que me faz tão bem. Por que eu não faço triathlon? Naquele momento, que você não tem nada a perder, sabe? Você truca. Eu truquei. Quer saber? Se eu sarar, se eu passar dessa, vou fazer triathlon. E eu estava achando que eu ia morrer rápido. Fiz a cirurgia, deu tudo certo. Foi uma cirurgia bastante complicada, meu pós-operatório demorou sete meses para voltar a forma, cortaram meu diafragma, uma parte do fígado. Mas, quando eu me recuperei, comecei a treinar. Um ano e meio depois, fiz minha primeira prova de triathlon”, lembra.
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A Nathália conta que quando fez essa primeira prova, absolutamente tudo mudou, e o empoderamento e a liberdade de poder fazer o que quiser chegaram e para ficar:
“Pela primeira vez na minha vida, senti que eu podia qualquer coisa, porque passou um filme na minha cabeça. Há quase dois anos eu estava na maca, achando que eu ia morrer, e hoje tô aqui forte, completei 3 horas de prova, nadei, pedalei, corri. Eu sou fod*. Posso qualquer coisa. A partir daí, o esporte tomou uma proporção muito maior na minha vida. Virou protagonista.”
Nathalia Fuzaro, jornalista e cofundadora do Inspira e Transpira
Liberdade e IRONMAN 70.3
Se o triathlon mostrou que ela podia tudo, a busca por completar o IRONMAN 70.3 (3.860 metros de natação, 180.25 km de ciclismo e 42.2 km de corrida) foi uma catarse. “Nesse primeiro momento, essa primeira chegada, eu percebi que eu podia tudo. Foi um despertar, o momento em que eu pensei: opa, tem alguma coisa aqui. Já não sou a mesma pessoa, senti uma confiança e uma liberdade, no sentido de pensar que não tem nada que eu não possa fazer. Eu não tenho uma doença que vá me barrar, não tem fraqueza, fragilidade. Depois que eu tirei o rim, comecei a acreditar que eu era frágil, que minha saúde era frágil. Pela primeira vez na vida, senti o contrário. Senti que eu era a pessoa mais forte do mundo. Foi um despertar”, conta.
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Quando sua treinadora sugeriu o IRONMAN, a Nath voltou a sentir confiança. “Essa liberdade veio de novo, no sentido de pensar que posso sonhar isso. Por que eu nunca sonhei isso? Por que eu achava que eu não era capaz? Então comecei a treinar”, conta. Dois anos depois, com um casamento no meio do período, fez a prova.
“Essa prova pra mim foi a grande catarse da vida, a que mudou tudo, que me deu coragem de pedir demissão para fazer uma guinada profissional, mudou meu relacionamento, mudou tudo. Foi quando me senti empoderada no sentido mais potente da palavra. É uma brisa meio louca. Quando você se dedica a fazer um esporte de longa distância, de endurance, você passa horas fazendo a mesma coisa. Você vê um filme da sua vida. Só que quando você completa esse desafio, realmente percebe que não tem nada que uma mulher não possa fazer quando ela acredita nela mesma, quando tem determinação e coragem. Quando a gente segue a vontade que vem aqui de dentro, a gente é quem a gente é. Foi no momento que eu me senti mais potente na minha vida, porque eu estava fazendo o que eu queria fazer, tive clareza que eu não estava mais feliz no trabalho e precisava mudar. Sabe quando você tem coragem de tudo? Eu falei: chega, essa é a nova Nathalia, agora eu sou assim, agora vai ser diferente. E aí a coisa mudou completamente.”
Nathalia Fuzaro, jornalista e cofundadora do Inspira e Transpira
Para a jornalista, a primeira sensação de liberdade veio com a primeira linha de chegada, que mostrou que ela podia fazer qualquer coisa. A segunda trouxe a certeza da liberdade de ser quem ela é, de recomeçar, de cair, quebrar, falhar, correr atrás e conseguir. “Os dois foram momentos super empoderados, mas tem uma diferença, uma sutileza. O segundo foi uma catarse, em que tudo mudou pra mim real”, finaliza.
Corpo de atleta e o que é esporte
Durante o papo com a Nathália Fuzaro sobre o esporte, a cirurgia para retirar um rim, o trabalho de empoderamento através do esporte e a liberdade de movimento, surgiu o papo sobre o que é um corpo de atleta. Do quanto há uma visão idealizada de que o atleta deve ser de um jeito específico, único, em geral, magro, forte, super saudável. A verdade, porém, não deveria ser assim.
“Atleta, para mim, é uma pessoa que leva o esporte como estilo de vida. E isso conversa muito com o que a gente prega no Inspira e Transpira. A gente não tem que praticar esporte para ser magra. A gente tem que praticar esporte para ser saudável. Para fazer bem, para ter saúde mental e física. Fazer esporte é você cuidar de você. É você cuidar da sua saúde física, mas muito mental também. O esporte está muito atrelado à saúde. Por mais que hoje eu esteja muito ligada a uma pegada performance, não me deixo noiar. Não me deixo cair nessa, porque eu sei que eu não tenho esse talento para ser uma atleta profissional.”
Nathalia Fuzaro, jornalista e cofundadora do Inspira e Transpira
Atrelado esse papo, também vem o que é considerado esporte e também a questão do etarismo. “Tem muito de nós mulheres ocuparmos nossos espaços. Por que uma mulher não pode correr na estrada? Por que ela tem que ter medo? A gente não quer mais isso. Essa liberdade de poder fazer a atividade que a gente quiser. Se hoje eu inventar, quero fazer dança, já me falam 'você é muito velha'. Não sou, quem disse? Você não precisa correr a maratona performando, você pode correr a maratona em 6 horas. Não vai deixar de ser uma maratona. E mesmo essa coisa do movimento: por que yoga não é esporte? Por que break dance não era esporte? Tá aí, vai entrar nas Olimpíadas de 2024. É dança”, aponta.
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“Você pode fazer o que você quiser. Se quiser fazer pole dance agora, você pode. Ah, mas pole dance não é um esporte, não é uma atividade. Você está mexendo o seu corpo? Isso está te fazendo bem no mental e no físico? É só o que importa. Quando uma mulher começa a se movimentar e começa a gostar, aquilo vai mudando ela por dentro. O esporte empodera e transforma a vida das pessoas. A gente só precisa dar o primeiro passo, a gente só precisa começar.”
Inspira e Transpira
Tudo o que a Nath viveu culminou na parceria dela com a Natália Leão no Inspira e Transpira, que nasceu no dia 8 de março de 2020, pouco antes da pandemia do novo coronavírus estourar no Brasil. “A gente sentia falta de algum lugar, de um espaço que falasse de esporte para mulheres além da estética. É esporte, é se sentir bem”, diz.
“A gente queria além de comunicar, trazer isso para a prática, treinar junto, trazer pessoas. É isso que a gente fala: o Inspira é uma roda de conversa, são amigas. A gente quer realmente ajudar e trazer para prática. Não queremos ficar só no mundo das ideias e da comunicação, posts nas redes sociais. A gente quer trazer pra solução. E o que a gente percebeu é que não tinha um espaço que humanizasse. A gente sentiu que não tinha ainda um lugar que falasse de esporte além da estética.”
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A dupla tem muitos planos para o futuro com o projeto, muitos ainda em espera por conta da pandemia. “Foi uma decisão baseada no nosso sentimento, na nossa demanda, porque a gente não tinha um lugar para ler conteúdo do jeito que produzimos hoje. Todo conteúdo que a gente produz, a gente se coloca como leitora. A gente traz muito para nossa pele. Nosso trunfo é que é muito verdadeiro, a gente não força a barra.”
“Hoje estamos aqui falando de feminismo, de como o esporte empodera. Estruturalmente, talvez hoje não mude nada, mas lá frente, quando minha sobrinha tiver 34 anos (minha idade hoje), ela não vai ter que passar por coisas que a gente passa, de medo de correr a noite, ela vai poder ser ainda mais livre”, finaliza.